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Clássicos na Crítica | A Bela e a Fera

 

 

 

“Quero viver num mundo bem mais amplo
Com coisas lindas para ver
E o que o mais desejo ter
É alguém pra me entender
Tenho tantas coisas pra fazer…”


De todos os memoráveis e incríveis clássicos Disney, A Bela e a Fera (lançado originalmente em 1991 nos Estados Unidos) talvez seja o que mais tenha conquistado o público em massa. Com o honroso título de primeira animação a ser nomeada ao Oscar de Melhor Filme e muitas outras indicações e prêmios na bagagem (incluindo o Oscar de Melhor Trilha Sonora e Melhor Canção Original), a trigésima animação dos estúdios Disney cativou desde a mais inocente criança até o adulto mais durão. Com seu conto de fadas romântico, seus personagens e músicas cativantes e, principalmente, sua mensagem tocante, A Bela e a Fera foi feito para ser um clássico e não foi à toa que a Disney o trouxe de volta aos cinemas, agora em 3D. O que é bom é para ser mostrado, e estava mais do que na hora da nova geração apreciar esse magnífico conto de fadas em sua mais famosa e bela versão.

 

 

O filme é baseado no tradicional conto francês, cuja mais famosa versão foi escrita pela Madame Jeanne-Marie LePrince de Beaumont. A estória já foi adaptada, encenada e filmada inúmeras vezes e muitas versões diferentes do conto original existem em todo o mundo, sempre se adaptando a diferentes culturas e sociedades. O clássico da Disney é uma adaptação muito próxima do conto original. A trama se passa na França renascentista, onde um príncipe arrogante e mimado despreza uma velha mendiga em uma gélida noite de inverno. Cercado por seus fiéis criados, o príncipe nega abrigo à senhora em troca de uma singela rosa. A velha o aconselha a não se deixar enganar pelas aparências, mas o arrogante jovem, enojado por sua feiura, volta a expulsá-la. A mendiga então se transforma em uma bela feiticeira. O príncipe tenta pedir perdão, mas a feiticeira não o perdoa, pois vê que não existe amor em seu coração. Ela amaldiçoa o castelo e todos que vivem nele. O príncipe então assume a forma de uma horrível fera e se confina no sombrio castelo, tendo apenas um espelho mágico como sua janela para o mundo exterior. A rosa oferecida pela feiticeira é mágica e floresceria até o 21º aniversário do príncipe. Caso ele não amasse e fosse correspondido até essa data, o feitiço jamais se quebraria e tanto ele quanto todo o castelo permaneceriam sob aquela maldição para sempre.

Dez anos depois, o pai de uma jovem chamada Bela se perde e invade o castelo da Fera em busca de abrigo. A Fera, em sua fúria, o aprisiona. Bela, desesperada, oferece sua prisão em troca da liberdade do pai. A Fera aceita e a presença de Bela no castelo traz esperança a todos os amaldiçoados, porém simpáticos, habitantes do castelo, pois a rosa mágica está cada vez mais murcha e Bela pode ser a moça que vai trazer amor ao coração do príncipe arrogante, libertando todos da terrível maldição. Mal sabem eles que todo esse clima de romance pode ser destruído por outro jovem arrogante chamado Gaston, que vai fazer de tudo para ter Bela como sua esposa, quer ela queira ou não. É a fórmula perfeita de um típico conto de fadas Disney.

 

 

O que mais encanta em A Bela e a Fera é a forma como toda a história segue uma estrutura extremamente típica de um musical da Broadway. As músicas servem para apresentar personagens, mas ao mesmo tempo servem como cenas completas, misturando diálogos com música de forma sublime. Na época do lançamento do filme, o New York Times disse que “A Bela e a Fera é o melhor musical da Broadway que não está na Broadway, e sim nas telas do cinema, em forma de animação”. Isso é muito visível na música de abertura, “Bela”, que apresenta a protagonista aos olhos do povo do vilarejo em que ela vive. Confesso que é uma das minhas cenas favoritas, não só pela música quanto por toda a montagem. Como disse, lembra muito o estilo da Broadway, com vários vocais, coros e interação através de diálogos.

Outra cena nesse estilo é a música “Gaston”, que não só caracteriza o vilão, mas também é usada para mostrar seu plano para se casar com Bela. Abro um espaço aqui para dizer que Gaston é um dos vilões que eu menos gosto. Acho-o extremamente irritante com aquela voz de tenor, e ainda mais irritante por ser tão ridículo que nem porte de vilão ele tem. Pelo contrário, parece um playboy da época da renascença, preocupado apenas em “pegar” a garota da vez. A diferença de comportamento e de atitude de Gaston para um vilão como Scar ou Jafar, por exemplo, é gritante!  Ainda mais irritante é seu ajudante LeFou, que serve basicamente pra se bater em tudo, e ser o alívio cômico do vilão. Cadê a genialidade humorística de um ajudante vilanesco do porte de Iago ou das Ienas? Portanto, não é surpresa eu também não gostar muito da música “Gaston”. Não por não ser boa, mas por eu não simpatizar o suficiente com o personagem para tal. Enfim, voltemos à programação normal…

 

 

Em A Bela e a Fera, nenhuma música é considerada desnecessária. Elas estão ali exatamente para contar uma parte importante da história, mérito dos autores Howard Ashman e Alan Menken. “Alguma coisa acontecer” foi criada exatamente para mostrar o lento processo de mudança de caráter e personalidade da Fera através de sua convivência com a Bela. “A Canção da Multidão” (muito parecida com a canção “Bárbaros“, de Pocahontas) funciona para criar a tensão e o clima da batalha entre o povo da vila e os habitantes do castelo, enquanto Gaston invade o castelo da Fera. Você pode até pensar: Ah, mas “Seja Nossa Convidada” não avança em nada a história, só serve pra deixar o filme mais bonito e divertido, certo?

Errado. Repare a letra da música e você vai notar que ela diverte e traz o número musical visualmente mais trabalhado do filme, mas também mostra a felicidade e animação dos criados do castelo de, após tantos anos, poderem servir um convidado e ter esperança novamente. E claro, não posso deixar de falar da cena mais famosa do clássico, quando o casal protagonista dança no grande do salão do castelo ao som da música que recebe o nome do filme. “A Bela e a Fera” traz o clima perfeito de romance à cena, pois a própria letra da música retrata de forma singela toda a história e trajetória do casal. A genialidade musical do filme é óbvia, e não foi por menos que, anos depois, a história chegou realmente à Broadway com músicas e letras de Alan Menken, Howard Ashman e Tim Rice, e se tornou um dos musicais de maiores sucesso da Broadway.

 

 

Outro ponto que me chama muito a atenção no filme são seus personagens. Impossível não se apaixonar pela doçura e personalidade de Bela, muito a frente do seu tempo, com pensamentos feministas e atitude oposta a das mulheres da época. Volto a ressaltar, nesse texto, que esse tipo de princesa Disney passou a ser o padrão nos anos 90. Foi assim com Bela, Mulan, Pocahontas, Nala, e outras. Vista como uma esquisita, filha de um inventor e sempre lendo livros, toda a aldeia fala pelas costas de Bela, porém nem o mais preconceituoso homem da aldeia deixa de suspirar quando passa por ela. Seu nome faz jus à sua beleza (em minha opinião, é uma das princesas mais lindas) e seu jeito meigo e educado conquista até o homem mais durão. Já a Fera possui um temperamento extremamente explosivo. Após anos enclausurado num castelo sombrio e vendo-se preso no corpo de um monstro, sua raiva e mágoa é compreensível.

É divertido vê-lo tentar entender que seu humor precisa mudar para conquistar Bela. Se na primeira parte do filme sua postura é assustadora para o espectador, a partir do momento em que Bela chega ao castelo, podemos ver pouco a pouco que existe um homem magoado dentro dele. Um homem que está tentando aprender uma lição e mudar os seus sentimentos. Uma comparação que pode ser feita é o modo como tanto Bela quanto a Fera são vistos pelas outras pessoas: Bela é a esquisita por causa de seu jeito, e Fera é visto como um monstro por causa de sua aparência. Ambos estão fora do padrão e por isso se completam e se identificam um com o outro ao longo da história. Além do casal de protagonistas, temos ainda os ótimos coadjuvantes, como Maurice, o adorável pai de Bela; Lumiére, o castiçal e mordomo chefe do castelo; Horloge, o relógio e também mordomo do castelo; Madame Samová, o bule e governanta do príncipe; e Zip, o filho de Madame Samová, em formato de xícara e que rouba todas as cenas com sua fofura. O castelo tem inúmeros personagens em forma dos mais variados móveis, objetos e talheres, e mesmo assim todos eles são explorados de forma satisfatória ao longo do filme.

 

 

A qualidade da animação é inquestionável. A Bela e a Fera foi um filme pioneiro no uso da animação 2D mesclada com o CGI em 3D através dos cenários. Tal técnica favoreceu ainda mais a conversão do filme para o 3D. A sensação de profundidade é sentida em todo o filme e faz a experiência de espectador ser ainda mais prazerosa, inserindo ainda mais o público na história. Até as cenas mais simples têm uma incrível e linda sensação de profundidade que só o 3D pode proporcionar. Vide a primeira cena do filme, onde vemos o castelo do príncipe de longe, com uma visão da floresta ou quando a câmera voa pelo salão do castelo enquanto o casal dança.

As cores, fortes e chamativas, de muitas cenas do filme estão tão exaltadas como em um Blu-ray (apesar de os óculos 3D diminuírem um pouco essa sensação), mostrando como toda a animação funciona bem na tela grande. Eu, particularmente, adoro os traços de A Bela e a Fera. Toda a forma como o filme é idealizado combina perfeitamente com o clima renascentista da história, fazendo muitas cenas parecerem verdadeiros quadros de pintores famosos. Se você é fã desse clássico, você está intimado a ir apreciá-lo nos cinemas. Vale muito a pena pela experiência inesquecível.

 

 

A Bela e a Fera não esteve muito presente na minha infância. Assisti poucas vezes quando pequeno e só voltei a vê-lo já adulto, com o lançamento em Blu-ray. Apesar disso, é um clássico que gosto muito e que, agora que já posso interpretá-lo melhor, vejo ser um filme muito humano. Apesar de todo seu lado fantasioso, a história é retratada de forma muito simples, mas ao mesmo tempo tocante. O romance entre Bela e a Fera é retratado quase como uma comédia romântica, mostrando as partes engraçadas e também mais sérias do relacionamento dos dois.

Vemos os dois brincando na neve e até na hora do jantar. Mas também vemos cenas singelas, como a que Bela mostra à Fera que os pássaros não existem ali para atrapalhar sua vida e que ele pode tê-los como amigos, é só ter paciência. Ou quando a Fera mostra a biblioteca para a Bela e “dá” todo o aposento a ela como um presente. Se, no começo, Bela apenas vê um monstro na forma de Fera e ele só enxerga uma jovem belíssima, depois que eles se conhecem, ela se apaixona pelo homem dentro do monstro, e ele, pela doçura em forma de beleza.

 

 

Essa relação interna entre os dois é retratada de forma lindíssima através do olhar. Notem como os olhos deles são grandes e expressivos. A primeira vez que vemos o príncipe em sua forma humana é através daquele quadro que ele rasga depois de sua transformação. E também é assim que Bela o vê pela primeira vez em forma humana. E, apesar de isso não estar claro no filme, a primeira coisa que ela nota é como os olhos dele se mantiveram os mesmos depois da transformação. É o sinal de que o homem ainda vive ali dentro, de que ele pode mudar. E após a quebra da maldição, essa também é a primeira coisa que Bela nota no príncipe. Ele mudou, mas os olhos da fera ainda estão no rosto daquele homem. Ambos continuam a mesma pessoa. No final, A Bela e a Fera é sobre sentimentos. Paradoxais, opostos, idênticos, românticos, loucos, arrogantes, doces. Mas são sentimentos. E sentimentos são fáceis de mudar, já dizia a canção…

 

“Sentimentos vêm
Para nos trazer
Novas sensações
Doces emoções
E um novo prazer

E numa estação
Como a primavera
Sentimentos são
Como uma canção
Para a Bela e a Fera…”

 

 

Fique de olho para os próximos especiais dos “Clássicos na Crítica“!


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Escrito por Felipe Andrade

Estudante de Administração, nerd, cinéfilo, colecionador e uma eterna criança. Não exatamente nessa ordem...

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