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A Outra Ponta do Lápis | Milt Kahl

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Nas edições anteriores de A Outra Ponta do Lápis, falamos sobre animadores famosos por terem dado vida à princesas, vilões e feras. Dessa vez, eu os convido a conhecer um pouco mais um dos maiores animadores que já trabalhou dos estúdios Disney.

Intitulado como um dos Nove Anciões, Milt Kahl foi responsável por animar dezenas de personagens diferentes e é usado como referência e fonte de inspiração por animadores veteranos como Andréas Deja (Scar, Jafar e Gaston) e Richard Williams (Uma Cilada para Roger Rabbit).

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“Eu sou perfeito para essa mídia. Eu não tenho limitações, posso fazer qualquer coisa.”

Milt Kahl

A vida de Milt Kahl não foi nada fácil ou repleta de bons momentos. Ele nasceu no dia 22 de Março de 1909, na cidade de São Francisco na Califórnia. Seu pai abandonou a família quando Milt era ainda muito jovem, o que o deixou com muita mágoa e o obrigou a crescer mais rápido do que deveria.

Sua família era extremamente pobre e ele precisou abandonar a escola aos dezesseis anos para ajudar a manter a casa. Ele trabalhou no departamento de arte do jornal Oakland Post Enquirer e no San Francisco Bulletin. Posteriormente, começou a trabalhar como artista profissional.

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Devido a sua condição financeira. Kahl não teve a oportunidade de frequentar instituições de ensino superior que garantissem um forte conhecimento artístico. Mas isso não foi obstáculo. Como um sábio ratinho nos ensinou, um talento pode surgir em qualquer lugar. Enquanto trabalhava como artista para se sustentar, Kahl fez aulas de desenho e estudou anatomia.

Ele se aprofundou cada vez mais e adquiriu o conhecimento básico necessário para qualquer animador que deseje transmitir sinceridade através de seus personagens. Tempo e energia não devem ser gastos para ser conseguir uma proporção ideal, mas sim para se conseguir a atuação ideal.

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O artista foi contratado pelos estúdios Disney em Junho de 1934, quando se mudou para Los Angeles. Sua carreira começou devagar. Ele participou da produção de curtas como Mickey’s Circus (1936) e animou os animais vistos em Branca de Neve e os Sete Anões (1937).

Sua grande estréia como animador, e oportunidade para provar seu talento, veio com a produção do filme Pinóquio (1940). Os animadores do estúdio não conseguiam criar um design que representasse a personalidade de Pinóquio sem torná-lo antipático. Todos os esboços e estudos feitos apresentavam um personagem frio e mecânico, demasiadamente similar a um boneco real, deixando de lado sua criança interior.

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Kahl, então, fez algo que se tornaria sua maior característica e contribuição para o estúdio: modificou o design do personagem se baseando em desenhos já feitos por outros artistas. Ele se concentrou em destacar a lado humano de Pinóquio e o tornou carismático na medida certa.

O animador se destacou por sua habilidade de refinar o design de personagens de maneira que o resultado final fosse capaz de transmitir a personalidade de cada um do modo mais claro possível. Ele fez o mesmo anos depois em Bambi, adicionando traços humanos a um dos personagens mais realistas do estúdio. Milt não se contentava apenas em criar uma aparência eficaz, ele planejava cada ação com cuidado, garantindo que ela ajudasse a contar a história principal. Ele gastava horas explorando todas as alternativas possíveis até encontrar a que melhor passaria sua mensagem.

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Seu talento era tão grande, que outros animadores, como Frank Thomas e Ollie Johnston, adquiriram o hábito de ir até a sua sala e pedir que desenhasse outras alternativas de posições sobre os desenhos iniciais. Ele foi, sem querer, um tutor para todos.

Mas não se deixe enganar, Milt não era um artista calmo ou paciente. Era constantemente seco, rude e se mantinha afastado de todos durante a maior parte do tempo. Seu ego inflado e temperamento esquentado eram conhecidos por todos e lhe custou algumas demissões e desentendimentos. Ele verdadeiramente se considerava o melhor dos melhores, não gostava de trabalhar em equipe e era com frequência ouvido gritando e xingando.

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“Milt tinha um lado doce e solícito quando ele queria.”

Frank Thomas e Ollie Johnston

Após dar vida a Pinóquio, Milt animou dezenas de outros personagens. Na época, era comum um artista animar diferentes personagens em um mesmo filme. Principalmente quando esses personagens interagem entre si. Entre os mais famosos estão: Pinóquio (Pinóquio, 1940); Bambi (Bambi, 1942); Fada Madrinha (Cinderela, 1950); Alice, (Alice no País das Maravilhas, 1951); Peter Pan e Wendy (Peter Pan, 1953); e Vagabundo (A Dama e o Vagabundo, 1955).

Prícipe Philip, Rei Humberto e Rei Estevão (A Bela Adormecida, 1959); Roger; Anita e Pongo (101 Dálmatas, 1961); Merlin e Madame Mim (A Espada Era a Lei, 1963); Mogli e Shere Khan (Mogli – O Menino Lobo, 1967); Madame Bonfamille e Edgar (Aristogatas, 1970); Robin Hood, Xerife de Nottingham e Marian (Robin Hood, 1973); Madame Medusa e Penny (Bernardo e Bianca, 1977); também estão entre as suas contribuições.

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Como puderam perceber, a gama de personagens animados por Kahl é enorme e engloba diversos estilos. Desde humanos realistas até raposas que falam. De fato, Kahl pode ser considerado o responsável pela criação do estilo clássico Disney, tão amado pelos fãs e fácil de se identificar. Há, no entanto, três personagens que melhor sintetizam sua carreira e sobre os quais gostaria de falar um pouco mais: Príncipe Philip, Shere Khan e Madame Medusa.

Príncipe Philip representa, acima de tudo, a capacidade das forças do bem de vencer as do mal. Ele precisava transmitir heroísmo e sentimentos sinceros sem pode agir de maneira extravagante. Não é apenas um humano, é um humano exemplar, capaz de vencer dragões e lutar por quem ama. Animar pessoas, principalmente príncipes, sempre foi motivo de discussão entre os animadores.

“Eu acho que você deveria ser capaz de anima príncipes, ou princesas, ou qualquer outro tipo de personagem difícil. e torná-los críveis. Não estou falando de realismo.”

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Tais personagens são difíceis pois não podem ter expressões e ações exageradas e não são divertidos. Milt foi escolhido para animar esse mesmo modelo de personagem diversas vezes durante sua carreira por sua precisão com o lápis. Mesmo achando a tarefa de dar vida ao príncipe árdua e entediante, Milt a cumpriu com louvor.

Animais que falam são sempre diretamente ligados à Disney, principalmente em animações. Ao animar o tigre Shere Khan, de Mogli – O Menino Lobo, Milt conseguiu transmitir através de seus desenhos uma enorme sensação de sinceridade e sentimentos humanos. Kahl trabalhou se inspirando no ator George Sanders, a voz de Shere Khan no original, e criou um vilão elegante e intimidador. Não há como não temer por Mogli. E, ao mesmo tempo, não conseguimos evitar ser envolvidos pelo carisma do vilão. Nossos olhos ficam vidrados e prestamos atenção em tudo o que diz.

“Em cada desenho, eu sei exatamente onde está o peso.”

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Milt não criou do zero o design de Shere Khan, outros artistas realizaram esboços e estudos. Mas foi ele o responsável por unir todos os conceitos criados até então em um design final que funcionou perfeitamente. Khan não intimida apenas através de sua aparência, mas principalmente pelo modo como se movimenta. Se por um acaso você se lembrou de um leãozinho chamado Scar ao assistir ao vídeo, não foi coincidência. Andreas Deja se espelhou muito em Milt e com certeza absorveu seu modo de animar.

Madame Medusa foi o último trabalho do animador para os estúdios Disney. E, como tal, foi feita com todo o conhecimento acumulado de Milt. Ela é uma personagem humana caricata e que, apesar disso, consegue transmitir com veracidade seus sentimentos e intenções. Ela é desprezível e causa repulsa na maioria dos espectadores. A maneira como se movimenta é hipnotizante. Ela é a prova de que Milt não consegue animar apenas personagens sérios e contidos.

“Na verdade, eu não desenho muito bem. Eu só não paro de tentar com rapidez. Eu insisto. Eu tenho altos padrões e tento alcançá-los. Eu tenho que penar muito para fazer um desenho que fique bom”

Milt Kahl

O afastamento de Milt Kahl dos estúdios Disney, onde trabalhou por décadas, foi gradual. Desentendimentos começaram durante a produção de Aristogatas (1970). Milt se isolou ainda mais e parou de auxiliar os animadores com seus desenhos e orientações.

Quando começou a trabalhar em Bernardo e Bianca (1977), o animador, infelizmente, decidiu que já estava na hora de se desligar dos estúdios. Ele saiu da empresa em Abril de 1976 e se aposentou. Voltou a trabalhar com esculturas de metal e manteve contato com poucos amigos animadores, como Marc Davis e Andreas Deja.

Milt Kahl faleceu em Abril de 1987. Ele deixou um legado imensurável para os artistas e animadores das próximas gerações.

Separei alguns vídeos para que você possa apreciar um pouquinho mais o trabalho de Kahl. Primeiramente, uma rara entrevista concedida pelo animador e, em seguida, algumas animações feitas por ele de outros personagens.

Disney Family Álbum:

https://youtu.be/PV9PlBZ5TUM

Madame Mim:

Rei Louie:

Roger:

Frank Thomas e Milt Kahl em A Dama e o Vagabundo:

Qual seu personagem do animador favorito, Camundongos? Particularmente, acho Madame Medusa fascinante. Desde seu design até a maneira como se move. Ela é assustadora da maneira mais humana possível.

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Escrito por Caroline

Designer Gráfico, Disney freak, viciada em café, quer ser roteirista e princesa quando crescer. Têm mais livros do que deveria e leu mais vezes “Orgulho e Preconceito” do que têm coragem de admitir.